4 min • 30/08/2021
Falar sobre comportamentos destrutivos e auto lesivos é sempre desafiador porquê a preocupação é grande quando se está num campo tão delicado e que pode ter consequências trágicas.
Muitas pessoas querem saber como evitar um suicídio, como ajudar alguém em sofrimento, por que algumas pessoas desistem de viver e se matam e como superar uma perda por suicídio. Sob o profissional de saúde mental inquerido por essas questões, recai a responsabilidade de trazer respostas que deem conta das dúvidas e aliviem a angústia.
Ao me propor a escrever este artigo por conta da aproximação de Setembro, mês dedicado a ações de conscientização e de prevenção do problema, me vi relendo cartilhas de orientações e diversos artigos de especialistas que se dedicam a compreensão deste fenômeno e então pensei:
“Por que ler isso tudo de novo? Para escrever mais do mesmo? Escrever sobre as teorias e dados epidemiológicos darão conta da angústia por traz das perguntas?”
Então decidi escrever algo diferente e que contivesse alguma reflexão.
Pensei sobre o que o suicídio comunica sobre o momento em que vivemos.
Em uma das cartilhas que li me deparei com a afirmação: “São quatro os sentimentos principais de quem pensa em se matar. Todos começam com “D”: depressão, desesperança, desamparo e desespero (regra dos 4D)”.
A OMS (Organização Mundial da Saúde) também aponta 3 características principais do comportamento suicida. São eles: Ambivalência, impulsividade e rigidez ou constrição de pensamento.
Karina Okajima Fukumitsu, suicidologista brasileira e que tem uma história pessoal de convívio com a dor e impotência diante das inúmeras tentativas de suicídio da própria mãe, concebe o suicídio como a “descontinuidade do sentido de vida”.
Com esses dados quero agora refletir sobre as características da sociedade pós moderna em que estamos inserido.
Vivemos em uma sociedade extremamente competitiva, que valoriza a produtividade e emite diversas mensagens de sucesso.
Nos comparamos como se só houvesse uma forma de Ser e assim, nos comparando com os outros, perdemos o contato com quem somos e nos desvalorizamos.
Nunca nos foi tão difícil responder sobre nossas preferências. Muitas pessoas não sabem responder coisas simples sobre si mesmo. Do que você gosta? O que você deseja para o seu futuro? O que dá sentido a sua vida? Quem é você?
“Ah… não sei! Como assim? Quero ser alguém?”
Você já é alguém!
Cada vez mais padecemos de solidão nesta sociedade em que os relacionamentos seguem a lógica do consumismo. Com frases como: “a fila anda” seguimos nossa vida negando o impacto das perdas em nós mesmos. Negamos nossa dor ou as afogamos num litrão como sugere diversas músicas.
Nada dura para sempre. Isso é verdade. Tá aí a morte para nos lembrar de que nada é eterno, mas também, na velocidade em que as coisas se dão… nunca as coisas duraram tão pouco. Nem relacionamentos nem os lutos diante dos rompimentos. “Contatinhos” estão aí para isso. A oferta é grande.
Vivemos um tempo de superficialidade em que podemos estar cercados de pessoas e sentir que ninguém nos conhece a fundo. Nem nós mesmos nos conhecemos.
Estamos perdendo a intimidade com nós mesmos. Mal sabemos quem somos e perdemos nosso tempo em joguinhos de Facebook na busca de respostas sobre: “Que tipo de animal eu seria”, “Como é a pessoa nascida em…” e assim por diante.
Suicídio sempre existiu, mas tem aumentado a medida em que sentimos que nossa existência tem perdido o sentido.
Dá pra entender a Depressão, Desesperança, o Desamparo e o Desespero e também a Impulsividade e Rigidez nos comportamentos suicidas, não é?
Como se sentir diferente numa sociedade tão narcisista e individualista, como ser menos impulsivos se somos tão imaturos e imediatistas?
O sofrimento existencial é um fenômeno individual e coletivo e aqui eu quis trazer algumas reflexões acerca do que compete ao coletivo, mas para não dizer que não tenho esperança… Tenho sim! Acredito imensamente na capacidade humana de se reinventar e de se desenvolver. Acredito que este cenário é passageiro e que aprendemos com nossos erros.
Em algum momento da vida todos nós já pensamos em morrer. Questiono: O que o suicídio iria resolver nos problemas que temos? Como diz minha chará Karina, “Se tem vida tem jeito”.
Pense em todas as pessoas ao seu redor. Quem é sua base segura? Deixe a porta aberta para receber ajuda. Se você não conseguir identificar alguém em quem confiar, procure ajuda profissional ou o CVV.
O CVV – Centro de Valorização da Vida realiza apoio emocional e prevenção do suicídio, atendendo voluntária e gratuitamente todas as pessoas que querem e precisam conversar. Ligue 188 e converse com voluntários capacitados, sob total sigilo 24 horas todos os dias.
Por: Karina Zanini Marques
Tradutora formada pela Univem desde 2003 e Psicóloga formada pela Unimar desde 2010 (CRP 06/103536) tem se dedicado profissionalmente única e exclusivamente ao ofício de Psicóloga.